“A morte não é o fim de tudo. Ela não é
senão o fim de uma coisa e o começo de outra. Na morte o homem acaba, e a alma
começa. Que digam esses que atravessaram a hora fúnebre, a última alegria a
primeira do luto. Digam se não é verdade que ainda há ali alguém, e que não
acabou tudo? Eu sou uma alma. Bem sinto que o que darei ao túmulo não é o meu
eu, o meu ser. O que constitui o meu eu, irá além. O homem é um prisioneiro. O
prisioneiro escala penosamente os muros de sua masmorra, coloca o pé em todas
as saliências e sobe até o respiradouro. Aí, olha, distingue ao longe a
campina, aspira o ar livre, vê a luz. Assim é o homem. O prisioneiro não duvida
que encontrará a claridade do dia, a liberdade. Como pode o homem duvidar se
vai encontrar a eternidade à sua saída? Porque não possuirá ele um corpo
subtil, etéreo, de que o nosso corpo humano não pode ser senão um esboço
grosseiro? A alma tem sede do absoluto e o absoluto não é desse mundo. É por
demais pesada para esta terra. O mundo luminoso é o mundo invisível. O mundo do
luminoso é o que não vemos. Os nossos olhos carnais só vêem a noite. A morte é
uma mudança de vestimenta. A alma, que estava vestida de sombra vai ser vestida
de luz. Na morte o homem fica sendo imortal. A vida é o poder que tem o corpo de
manter a alma sobre a Terra, pelo que faz nela. A morte é uma continuação. Para
além das sombras, estende-se o brilho da eternidade. As almas passam de uma
esfera para a outra, tornando-se cada vez mais luz, aproximando-se cada vez
mais de Deus. O ponto de reunião é o infinito. Aquele que dorme e desperta,
desperta e vê que é homem. Aquele que é vivo e morre, desperta e vê que é
Espírito.” VICTOR HUGO